Por William Souza
A Corte Constitucional da Itália avaliou nesta terça-feira (24) se a cidadania italiana por descendência (ou cidadania por sangue sem limite de gerações) é compatível com a Constituição.
O julgamento, sediado em Roma, teve como ponto de partida a remessa do Tribunal de Bolonha, publicada em 26 de novembro de 2024, que questionou a constitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 91/1992 — norma que até hoje reconhece a cidadania italiana por ius sanguinis, ou seja, por sangue, sem limitação temporal de gerações. Vale ressaltar que outros tribunais, como os de Florença e Milão, também interromperam processos semelhantes, à espera de um posicionamento definitivo da Corte Constitucional.
A audiência ocorre em um momento sensível, pois, em 27 de março de 2025, o Ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani, promulgou o Decreto 36/25, que após passar pelo Parlamento Italiano foi transformado na Lei nº 74/2025. Essa nova legislação restringe o direito à cidadania italiana apenas a filhos e netos de italianos nascidos na Itália. Em certos casos, a nova norma também exige que o ancestral tenha tido exclusivamente a cidadania italiana ou que o requerente tenha residido na Itália.
Após esse verdadeiro terremoto no mundo da cidadania italiana, as esperanças dos ítalo-descendentes nascidos no exterior se renovam. Embora a audiência desta terça (24/06) não tenha sido especificamente sobre a nova legislação, a decisão do Tribunal poderá abrir precedente. Caso o Tribunal confirme a validade do modelo anterior ao Decreto Tajani, as novas restrições poderão ser contestadas judicialmente.
Dando início aos trabalhos, a juíza relatora Emanuela Navarretta apresentou um relatório técnico contendo o resumo das questões submetidas. Em seguida, os advogados habilitados tiveram espaço para realizar suas sustentações orais. Foram eles: Giovanni Bonato, Marco Mellone, Antonio Cattaneo, Diego Corapi, Monica Restanio e Patrizio Ivo D’Andrea. A corte foi tomada por uma forte carga emocional e histórica — afinal de contas, tem a ver com a diáspora italiana, com a ancestralidade de milhares de ítalo-descendentes, e com o futuro de italianos espalhados por boa parte do mundo.
Destacamos aqui alguns trechos das falas dos nobres avvocati, que, diga-se de passagem, defenderam com força o direito de sangue. Abrimos aspas para o advogado Mellone:
“Estamos aqui, Presidente, para salvar o Estado de sua própria ineficiência administrativa. Se a lei sempre previu a cidadania por sangue, não se pode hoje dizer que é inconstitucional apenas porque o Estado falhou em aplicá-la.”
O advogado Antonio Cattaneo ressaltou o elo cultural e histórico:
“A cidadania não se restringe à presença física em território nacional. É um elo cultural, histórico e jurídico com o povo italiano, dentro e fora da Itália.”
Por sua vez, o advogado Giovanni Bonato defendeu a preservação do ius sanguinis como expressão legítima da história migratória italiana e da continuidade do povo italiano no exterior.
O professor e advogado Diego Corapi apresentou sua sustentação destacando os impactos jurídicos da nova legislação. A advogada Monica Restanio abordou a conexão entre cidadania, identidade nacional e vínculos históricos com a Itália. Já o advogado Patrizio Ivo D’Andrea argumentou com base no princípio da irretroatividade e na proteção dos direitos adquiridos dos descendentes de italianos.
Os advogados foram precisos, cirúrgicos — deram uma verdadeira aula de Constituição e direito ao defenderem o ius sanguinis diante da Corte, que ainda não divulgou a data para proferir sua decisão. Seguimos atentos.
Vivemos um marco histórico na Itália, onde o Estado precisou, diante de sua própria Corte Constitucional, confrontar suas escolhas legislativas frente à sua própria história — que diz respeito à diáspora italiana, à ancestralidade e ao futuro de milhões de descendentes. Andiamo avanti!!! 🇮🇹


